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Direito ao Voto de Presos no Brasil: Realidade, Mitos e Usos Políticos

Publicado em: 20 de julho de 2025 Por: Redação Redondeta Em: Política
Urna eletrônica em uma sala de presídio com grade ao fundo, simbolizando o voto de presos.

Em meio a discussões acaloradas nas redes sociais e nos palanques políticos, o direito ao voto de presos no Brasil tem sido frequentemente alvo de polêmicas e distorções. Mas afinal, quem pode votar atrás das grades? E por que esse tema se tornou um campo fértil para fake news e disputas ideológicas?

O que diz a Constituição

A Constituição Federal de 1988 é clara: apenas pessoas condenadas com sentença transitada em julgado — ou seja, sem possibilidade de recurso — perdem seus direitos políticos, inclusive o direito ao voto. Já os presos provisórios, que ainda aguardam julgamento, mantêm esse direito.

Apesar disso, nas últimas eleições, menos de 4% dos presos provisórios conseguiram efetivamente votar. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos mais de 200 mil presos provisórios no país, apenas cerca de 6 mil estavam aptos a votar nas eleições municipais de 2024. A razão? Falta de estrutura, documentação irregular e obstáculos logísticos.

Barreiras práticas e institucionais

Instalar uma seção eleitoral em um presídio exige, no mínimo, 20 eleitores regulares — o que inclui presos provisórios, servidores e mesários. Muitas unidades não atingem esse número. Além disso, muitos presos sequer têm título de eleitor regularizado ou acesso à Justiça Eleitoral para resolver pendências. A burocracia e a baixa prioridade dada ao tema por parte do Estado completam o cenário de exclusão.

"É comum circular a ideia de que 'presos votam e trabalhadores não têm vez', ou que 'presídios viraram redutos eleitorais de partidos de esquerda'. Essas falácias exploram a ignorância sobre o funcionamento do sistema penal e eleitoral."

Fake news e distorções

Apesar de a lei ser objetiva, as redes sociais frequentemente inflam o debate com informações falsas. É comum circular a ideia de que “presos votam e trabalhadores não têm vez”, ou que “presídios viraram redutos eleitorais de partidos de esquerda”. Essas falácias exploram a ignorância sobre o funcionamento do sistema penal e eleitoral, e alimentam uma agenda de criminalização da cidadania de pessoas privadas de liberdade.

Além disso, essas narrativas são instrumentalizadas para reforçar o sentimento de insegurança e revolta, mesmo quando presos condenados continuam, legalmente, sem direito ao voto.

Vieses políticos e seletividade

A resistência ao voto de presos provisórios expõe também um viés de classe e raça. A maior parte dessa população é composta por jovens negros e pobres, muitas vezes presos por crimes não violentos e em situações processuais precárias. A garantia do voto nesse grupo poderia significar maior representação das demandas periféricas e pressionar o sistema político por mudanças no sistema penal.

Contudo, para setores conservadores, o discurso da punição total ainda é politicamente rentável. A pauta “bandido não pode ter direito” rende votos e engajamento, mesmo que vá contra a Constituição. Já parte da esquerda evita a discussão por medo de desgaste popular, abrindo espaço para a desinformação dominar o debate.

Conclusão

O direito ao voto de presos provisórios não é concessão ideológica, mas um princípio constitucional e democrático. Negá-lo, além de ilegal, reforça a exclusão de uma parcela da população que já vive à margem. Em tempos de desinformação, garantir esse direito é também uma forma de fortalecer o Estado de Direito.

Mas para isso, é preciso mais que leis — é necessário vontade política, estrutura institucional e combate ativo às fake news que minam a cidadania em nome do populismo punitivista.